ARTIGO: Restituição de tributos e compensação de ofício

A Receita Federal utiliza da sistemática para coagir ilegalmente os contribuintes ao pagamento de débitos

Por Alysson Amorim Yamasaki

A Receita Federal quando identifica o deferimento às empresas de restituição de tributos pagos indevidamente, a maior ou decorrentes de programas fiscais – como o Reintegra -, mas que possuem débitos tributários pendentes de quitações e indicados perante o respectivo diagnóstico de situação fiscal, realiza intimações dos contribuintes para aduzirem se concordam ou não com a denominada compensação de ofício.

Na hipótese de discordância da quitação de ofício proposta, com base em norma infralegal, o Fisco federal retém os valores a título de restituição de tributos até que o crédito tributário seja integralmente liquidado.

|A Receita Federal utiliza da sistemática para coagir ilegalmente os contribuintes ao pagamento de débitos

Mencionada compensação de ofício possui previsão no artigo 73 da Lei nº 9.430, de 1996, artigo 7º do Decreto-Lei nº 2.287, de 1986, bem como a precitada retenção de valores no Decreto nº 2.138, de 1997, sendo importante instituto para reforçar os cofres públicos da União Federal e, concomitantemente, para redução do passivo tributário dos contribuintes.

Contudo, cabe ressaltar que o Fisco federal utiliza da sistemática para coagir ilegalmente os contribuintes ao pagamento de débitos vencidos, inscritos ou não em Dívida Ativa da União, com exigibilidade suspensa, nos termos do artigo 151 e respectivos incisos do Código Tributário Nacional (CTN), ou integralmente garantidos por meio de carta de fiança bancária ou seguro garantia.

Tal conduta fazendária nas hipóteses precitadas cristalinamente onera os contribuintes na medida em que frustra o recebimento dos valores para, por exemplo, o reforço de fluxo de caixa, realizações de investimentos, quitações de folha de salário, dívidas bancárias e de tributos vincendos.

No contexto, relativamente aos débitos tributários com a exigibilidade suspensa nos termos do Código Tributário Nacional (CTN), o próprio Poder Judiciário está rechaçando a ilegal maneira de agir da União, proibindo o procedimento quando diante de uma das hipóteses de suspensão do aludido artigo 151 da Lei Complementar nº 5.172, de 1966.

Nesse sentido, saliente-se o recurso extraordinário nº 917285, julgado pela sistemática da repercussão geral, em que o Supremo Tribunal Federal (STF) fixou a seguinte tese: é inconstitucional, por afronta ao artigo 146, III, b, da CF, a expressão ’ou parcelados sem garantia’ constante do parágrafo único do artigo 73, da Lei nº 9.430, de 1996, incluído pela Lei nº 12.844, de 2013, na medida em que retira os efeitos da suspensão da exigibilidade do crédito tributário prevista no CTN.

Outra precedência jurisprudencial favorável aos contribuintes advém do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, especificamente a apelação/reexame necessário nº 5001406-12.2019.4.03.6102, no qual restou consignado que não há possibilidade de realização de compensação de ofício enquanto perdurar a suspensão de exigibilidade dos débitos a serem compensados, nos termos do artigo 151 da Lei Complementar nº 5.172, de 1966, possibilitando-se, assim, a efetiva restituição aos contribuintes.

No entanto, é imperioso salientar que a coação do Fisco federal é agravada quando os créditos tributários estão integralmente garantidos por carta de fiança bancária ou seguro garantia, geralmente a fim de discussão sobre a legalidade da exação tributária. Isso porque não estão presentes os requisitos previstos no artigo 151 do CTN e não há jurisprudencial uníssona a favor das empresas.

Mas para a correta resolução da questão, deve-se levar em conta normas não tributárias que podem ser utilizadas com base em interpretação integrada, o que é permitido em direito tributário pelos artigos constantes no Título I, Capítulo IV, da Lei Complementar nº 5.172, de 1966, notadamente interpretação e integração da legislação tributária.

Com efeito, evidencia-se nessas situações a afronta expressa pela União aos princípios da razoabilidade, proporcionalidade e não confisco, já que a carta de fiança bancária e o seguro garantia equivalem a dinheiro para fins de garantia integral de débito tributário, são de fácil liquidação e estão em consonância com o princípio da menor onerosidade ao devedor, conforme disposto nos artigos 805 e 835, parágrafo 2º, do Código de Processo Civil, assim como já reconhecido pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do recurso especial nº 1838837.

Além disso, estando os créditos tributários integralmente garantidos pelas cauções fidejussórias aduzidas e da manifestação de discordância da compensação de ofício pelos contribuintes, a determinação de retenção de valores prevista em norma infralegal, especificamente o artigo 6º, parágrafo 3º, do Decreto nº 2.138, de 1997, afronta diretamente o princípio da legalidade, consignando-se, também, que a correta interpretação do artigo 73, parágrafo único, da Lei nº 9.430, de 1996, é a autorização do procedimento tão somente em relação a débitos tributários não garantidos, independentemente de parcelamento como já discutido perante o Poder Judiciário.

Em conclusão ao que foi exposto, existindo a intimação do contribuinte sobre a determinação da compensação de ofício, ou a retenção dos valores deferidos a título de restituição de tributos, com créditos tributários que estejam com suspensão de exigibilidade ou integralmente garantidos por carta de fiança bancária ou seguro garantia, é facultada a a impetração de mandado de segurança para a efetiva liberação dos montantes, com base nas afrontas expressas aos princípios constitucionais e respectivas legislações aludidos.

Alysson Amorim Yamasaki é advogado tributarista, diretor jurídico da Câmara do Comércio e Indústria Brasil Japão do Paraná, especialista em Direito e Processo Tributário pelo IBET, atualmente cursando MBA em Gestão Fiscal pela Universidade de São Paulo (USP)

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