O Brasil, maior exportador global de soja, tem a chance de se consolidar também como o maior produtor na temporada 2019/20, apesar de um aumento mais moderado no plantio, limitado pela guerra comercial EUA-China e pelo impacto da peste suína africana no rebanho chinês.
Com um crescimento estimado de 2,3% na área plantada, a safra poderia dar um salto de quase 7% ante a anterior, para um recorde de 122,8 milhões de toneladas, apontou a média de uma pesquisa com dez analistas e instituições.
Os números dos especialistas para a safra que será plantada somente a partir de setembro consideram uma recuperação nas produtividades após a seca que atingiu a produção na temporada passada, reduzindo a colheita para 115 milhões de toneladas, segundo dados do Ministério da Agricultura, que viu o último recorde em 2017/18 (119,3 milhões de toneladas).
O volume apontado na pesquisa permitiria ao Brasil superar os Estados Unidos com folga na produção de soja. O Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) estima a safra norte-americana em 104,64 milhões de toneladas, após problemas de enchentes na semeadura.
Mas o ritmo de aumento de plantio no Brasil, que vai se desenvolver à medida que as chuvas de primavera cheguem, será mais lento que no passado, com produtores cautelosos com a guerra comercial EUA-China e com a menor demanda chinesa por farelo de soja, atingida pela peste suína africana, entre outros fatores internos, como a tabela de fretes mínimos rodoviários, que eleva custos.
“Temos várias preocupações, tem o tabelamento, que não foi resolvido… o alto custo de produção… a guerra comercial entre EUA e China nos preocupa muito…”, disse à Reuters o presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja), Bartolomeu Braz Pereira.
Recentemente, as quedas na bolsa de Chicago decorrentes do recrudescimento da guerra comercial estão sendo compensadas por um fortalecimento nos prêmios pela soja brasileira. E o dólar mais forte frente ao real também tem ajudado a sustentar os preços domésticos.
Analistas, mesmo assim, citam a guerra comercial como fator limitador da área, diante das incertezas futuras, e não como algo que poderia impulsionar a demanda pela soja do Brasil, como ocorreu em 2018 em virtude da imposição de taxa à soja norte-americana pela China.
“A guerra comercial e a peste suína estão comprimindo os valores globais do grão… E isso associado também à forte elevação dos custos de produção (no Brasil) são fatores limitantes para o crescimento maior da área”, disse o analista da IEG FNP, Aedson Pereira.
MILHO COMPETE?
O analista da IEG FNP mencionou que a abertura de novas áreas no Cerrado perdeu intensidade em função dos elevados custos, e assim a soja deverá crescer sobre áreas já utilizadas pela agricultura, onde poderiam ser plantados milho, algodão e arroz, além de pastos.
Segundo Pereira, a área semeada com soja manterá sua trajetória de expansão, mas abaixo da média histórica. “Nos últimos dez anos, o incremento era de 5,1%, para o novo ciclo será de apenas 2%.”
Já o consultor Carlos Cogo, da Cogo Inteligência em Agronegócio, avalia que haverá o apelo para o plantio de milho na primeira safra, fazendo concorrência para a soja em algumas áreas do Sudeste e do Sul, diante da expectativa de preços melhores em meio a exportações recordes.
“Isso limita a área de soja. Embora esteja prevendo um aumento na soja, estou vendo uma taxa menor de crescimento, em função do milho de verão.”
O analista sênior do Rabobank, Victor Ikeda, que juntamente com Cogo tem a visão de um menor crescimento de área de soja entre todos os consultados (para 36,4 milhões de hectares), avalia que a expansão ocorrerá “na inércia” dos últimos anos.
“Ou seja, seguindo o planejamento estipulado em anos anteriores pelos produtores de conversão de áreas de pastagens degradadas em áreas agrícolas”, disse ele, citando cotações internacionais pressionadas pela guerra comercial e a peste suína, que não têm favorecido a intensificação desse processo de expansão da área de soja.
O Rabobank, a propósito, divulgou avaliação que indica que o rebanho de suínos da China pode cair pela metade até o final de 2019 devido à peste.
De outro lado, a Arc Mercosul, que tem a previsão mais otimista para plantio, de mais de 37 milhões de hectares, alerta que tal projeção pode não se concretizar, se chuvas não favorecerem as lavouras.
“Há um viés de que o início da safra brasileira sofra com a falta de chuvas entre outubro e dezembro”, afirmou o analista Matheus Pereira, lembrando que, apesar da indicação meteorológica, é difícil considerar isso como algo certo no momento.
Braz Pereira, da Aprosoja, também citou essa preocupação com um eventual atraso para o plantio por conta clima, o que interferiria na produtividade e na segunda safra.
Fonte: Reuters